( artigo publicado no semanário Grande Porto)
Um estudo feito por cientistas da universidade de Chicago, e recentemente publicado na revista Science, provou que os ratos sentem empatia entre eles.
O estudo consistiu no seguinte: colocaram-se dois ratos dentro de uma caixa de plástico transparente, fechada, mas cuja porta poderia ser aberta do interior e do exterior.Um pouco afastado da caixa colocaram um chocolate. Depois de aberta pelo interior, a porta fechava imediatamente logo que o primeiro rato saísse, deixando o outro rato fechado. O rato que conseguira sair dirigia-se ao chocolate. Mas, perante o chamamento do seu amigo enclausurado, em vez de se virar ao chocolate e o comer só ele, voltava para trás, libertava o amigo, e partilhavam ambos o chocolate que os investigadores tinham colocado à sua disposição.
Face a esta admirável lição de solidariedade entre os ratos ( pelos vistos partilhada por outros animais, nomeadamente macacos) não podemos deixar de nos lembarar das doutrinas dos economistas liberais que dominam o mundo contemporâneo, incluindo este pobre país agrícola, como dizia Salazar.
Segundo os liberais, esse comportamento solidário dos ratos, transposto para os humanos é altamente reprovável, porque antieconómico, e, quiçá, antihumano. Na verdade, seguindo o raciocínio liberal, o comportamento lógico dos ratos em situação idêntica deveria ser o seguinte:o rato que conseguiu safar-se primeiro da gaiola deveria dirigir-se ao chocolate e comê-lo todo. Só depois, e se não tivesse um pedaço de queijo que lhe cheirasse, voltaria para trás a libertar o seu colega.
Também seguindo o raciocínio liberal, adoptando este comportamento de rato economicus, daqui resultaria que, por efeito de uma mão invisível, os dois ratos acabariam por ficar bem e contribuir para o progresso geral da classe dos ratos. Mesmo que um comesse o chocolate quase todo e o outro se esganasse de fome, e ainda que tal acontecesse repetidamente, porquanto um dos ratos era mais apto que outro.
É claro que o rato mais apto, depois de abocanhar quase todo o chocolate existente, se tivesse os sentimentos de solidariedade cristã dos liberais, sempre daria uns restinhos de chocolate ao seu colega menos apto. Este ficar-lhe-ia eternamente grato, e o mais apto teria montanhas de chocolate como prémio no reino dos céus.
Mas o que os liberais querem para os humanos não o querem os ratos para eles. Preferem a solidariedade, e partilhar com os menos aptos a doce comida que lhes é dada.
E, então, falando em sentimentos e dignidade humana, só poderos concluir: os liberais colocam os humanos abaixo de ratos.