blog filosófico, cultural e político
Terça-feira, 30 de Novembro de 2004
O FIM DO PÂNTANO
Confesso que a decisão do Presidente da República de dissolver a Assembleia da República e convocar eleições antecipadas me surpreendeu. Não porque a decisão tomada não fosse a que se impunha. Não eram os comunistas, os bloquistas ou os socialistas, a CGTP e a UGT a dizerem que este primeiro-ministro não prestava. Era Marcelo Rebelo de Sousa, era Pacheco Pereira, era Cavaco Silva, era a CIP, era a CCP, era a CAP, era Ferraz da Costa e, finalmente, um ministro que saiu do governo não só a dizer que o Primeiro-Ministro não tinha capacidade para as funções que desempenha mas também a dizer que era desonesto- e, ainda por cima, a insinuar que havia pelo menos um ministro que não se demitira mas pensava o mesmo que ele.
A opinião pública que pensava por cabeça própria estava toda contra Santana Lopes e o seu governo.
Mas nunca acreditei que a pressão da opinião pública fosse essencial para a decisão de Jorge Sampaio. Já o tinha mostrado antes ao aceitar Santana Lopes como sucessor designado por Durão Barroso.
O que me surpreendeu foi que Sampaio percebesse qual era o interesse do país e tomasse o interesse do país como causa fundamental da sua decisão.
É que o interesse do país era o mesmo hoje que há quatro meses. E Sampaio não o percebeu, fingiu não o perceber, ou entendeu que o interesse do país estava numa hipotética estabilidade governativa que, há partida, e pelo perfil do Primeiro-Ministro, tudo indicava que não iria existir.
Mas agora o Presidente da República percebeu onde estava o interesse nacional. Percebeu que a credibilidade deste governo não andaria longe do valor zero. Percebeu que a falta de credibilidade do país no governo implicaria a falta de credibilidade do país em si próprio.
E sem credibilidade do país em si próprio não haveria investimento, porque os investidores não acreditavam no futuro. Não haveria consumo, porque os consumidores tinham medo do futuro.
E sem investimento e sem consumo o país não funcionaria, porque são os motores do crescimento económico. E, não havendo aumento nem do investimento nem do consumo, as receitas do Estado, quer as dos impostos quer as da Segurança Social, não aumentariam porque a base sobre a qual incidem os impostos e as receitas da Segurança Social não aumentaria.
Pelo contrário, as despesas do Estado aumentariam, porque aumentariam o desemprego e os respectivos subsídios. Isto mesmo que não aumentassem outras despesas.
Então já não era o governo que estava em causa, porque estava podre por dentro. Era o país que estava em causa, porque a podridão do governo alastrava-se para o país.
E se o Presidente da República não convocasse eleições antecipadas para o povo dizer o que queria, e ganhar assim nova confiança, a pretensa estabilidade governativa que Jorge Sampaio tanto mostrou que apreciava ( quanto apreciava a opinião dos que não o elegeram) iria lançar o país num a crise terrível, só comparável à que teve há alguns anos o México, país exemplo, sobre todos os demais, de estabilidade governativa.
Jorge Sampaio surpreendeu-nos porque desprezou a estabilidade governativa formal, a que ele tanta importância dava.
O Presidente da República, finalmente, decidiu, e decidiu bem, porque a estabilidade que o governo de Santana Lopes proporcionava ao país era a estabilidade do pântano em que o país se iria afundar nos próximos dois anos.
E, com a decisão do Presidente da República estamos, agora sim, em condições de chegar ao fim do pântano.
Sábado, 27 de Novembro de 2004
FERNANDO VALE
EM MEMÓRIA DE FERNANDO VALE
A morte de Fernando Vale não nos deve deixar tristes porque era inevitável, e, sobretudo, porque o seu exemplo há-de guiar o que há de melhor na sociedade portuguesa.
Fernando Vale pertencia a uma grande sociedade discreta, a Maçonaria. Que demasiado frequentemente vemos atacada por uma sociedade semi-secreta, na qual pontificam, por exemplo, o banqueiro Jardim Gonçalves e semelhantes- a Opus Dei.
Que melhor exemplo do que Fernando Vale da superioridade moral ( e não só) da Maçonaria a que pertencia Fernando Vale ( de algumas outras é melhor não falar) sobre a Opus Dei?
O nosso coração e nosso pensamento estarão sempre com Fernando Vale no Oriente Eterno.
OS VERDADEIROS RESPONSÁVEIS DO SECULAR ATRASO-Os homens das universidades
Um velho amigo meu, meu professor, professor universitário respeitadíssimo, entende que não tenho razão, os professores universitários não são responsáveis pelo que se passa neste país mais do que qualquer comum cidadão.
Mas não tem razão.
Insisto na minha tese: os professores universitários são os principais responsáveis pelo secular atraso deste país.
Senão vejamos: Como funciona o ensino neste país? Como funciona a saúde neste país? Como funciona a justiça neste país? Como funciona a administração pública neste país?
Creio que ninguém, incluindo o meu ilustre amigo, dirá que funcionam bem.
E se funcionam mal, quem dirige, e sempre dirigiu, estas áreas vitais para o país senão os homens das universidades e aqueles que foram formados pelos homens das universidades?
Quem é o primeiro responsável pela incompetência dos formados senão os formadores, isto é, os homens das universidades?
Parece-me, na minha humilde opinião, que estas verdades são indesmentíveis. E gostaria que o meu ilustre amigo, no seu blog, ou nos seus execelentes artigos no PÚBLICO, deduzisse argumentos contra esta tese.
Como compreende, trata-se de uma questão que merece muito mais tratamento do que o (agora) triste traste que nos governa.
Lançado o argumento e lançado o desafio ao meu ilustre amigo - e aos visitantes deste blog - irei agora mostrar as causas da responsabilidade dos homens das universidades no nosso secular atraso.
1ª Causa- O círculo fechado em que funcionam as nossas universidades.
Os homens das universidades funcionam em círculo fechado, protegendo-se a si próprios e aos seus pares de qualquer ameaça vinda do exterior.
Pode o doutorado pelas melhores universidades estrangeiras tentar leccionar nas universidades portuguesas. Dificilmente o conseguirá, porque dificilmente lhe reconhecerão o doutoramento.
Isto porque quem vier ameaça o lugar e o "brilho" dos que já lá estão instalados, e estes o que mais receiam é a instabilidade que lhes causa essa ameaça.
Daí que dentro das universidades funcionem o amiguismo, o elogío mútuo, o clientelismo e a estagnação, como principais factores de defesa dos que ocupam os seus lugares.
Creio que se trata de uma verdade dificimente desmentível tantos são os casos em a realidade é assim - e tão poucos aqueles em que a excepção ocorre, para confirmar a regra.
O último caso de que tivémos conhecimento, foi o de um brasileiro, doutorado pelas mais prestigiadas universidades americanas, classificado no grau superior a nível mundial, um grau em que não possuímos qualquer classificado na área científica desse brasileiro, que para dar aulas numa das faculdades da Universidade do Porto teve de se sujeitar a ser pago ao nível de um simples assistente.
Outros inúmeros exemplos são por demais conhecidos, desde as áreas científicas às artísticas, nomeadamente escolas superiores de música, onde ocorrem casos escandalosos de preterição da competência pela incompetência.
O saber nas universidades portuguesas funciona essencialmente em círculo fechado, auto-regulado e auto-protegido.
É por isso, por exemplo, que um licenciado em Direito sai duma universidade sem nunca ter visto um processo, que um licenciado em letras sai duma universidade sem saber o que é um aluno e uma escola, que um licenciado em economia nunca teve contacto com uma empresa, que um licenciado nas áreas científico-tecnológicas nunca contactou com os lugares fora da universidade onde funcionam, inseridos na realidade produtiva, os conhecimentos das suas áreas.
Daí que os seus formados valham o que valem, tenham as competências que têm demonstrado na gestão dos sectores essenciais para o bom funcionamento do país.
Nos Estados Unidos da América existe a regra de que um recém-doutorado deve mudar de universidade para continuar a leccionar.
A ruptura do círculo fechado poderia começar por aqui, e por outro tipo de reconhecimento dos graus académicos que não dependesse só dos homens das faculdades para as quais um académico graduado no estrangeiro pretendesse entrar.
Como segunda medida, mas não menos essencial, está a ligação obrigatória das universidades à realidade económico social, instituindo a obrigatoriedade de, pelo menos no último ano de cada curso, o formando ter contacto com a realidade económica, social e cultural onde pretendesse inserir-se, ligando esse contacto à apredizagem universitária.
Creio que, sem estas medidas, nunca o país descolará do secular atraso.
Domingo, 14 de Novembro de 2004
...
Como águas que regressam
perfumadas ao seu linho
tocamos as infinitas pálpebras,
tudo o que do lume inquieto
nos foi dado.
É então que o ouro se derrama,
os pássaros se erguem
dos capitéis de jaspe
e em nossos gestos são sagrados
os sinais do amor.
Ouvimos depois a terra
inclinar-se para nós,
único repouso que a morte não contém,
acampamento
morada.
HENRIQUE DÓRIA- Círculo da Terra
ATLAS DE LA HIRE
A «insustentável leveza» do nosso ser.
Na mesma linha,(Stephan Jay Gould) lembra o desaparecimento brutal dos dinossauros, provavelmente provocado pela queda dum meteorito gigante. E retoma à sua maneira a hipótese segundo a qual essa hecatombe teria deixado o caminho livre à evolução dos mamíferos... Suponhamos que, por um efeito gravitacional imprevisto, o meteorito assassino não acerta na Terra...Os dinossauros ainda lá estão; os mamíferos não evoluíram, não se ramificaram e...não deram origem aos hominídios. Conclusão de Gould: nada predestinava a consciência humana para aparecer na biosfera. Devemos dar graças à pedra celeste que teve o bom gosto de acertar no nosso planeta! Voltemos agora à elevação do Leste africano há uam dezena de milhões de anos. De acordo com alguns arqueólogos, este acontecimento terá desempenhado um papel fundamental na hominização dos símios. Abençoado movimento da placa africana que terá obrigado os hominídos a manterem-se de pé!
Resumindo a tese de de Gould: longe de ser determinada, a evolução biológica estaria completamente sujeita a acontecimentos fortuitos...
Esta posição radical suscita muitas emoções. A nossa existência seria fruto de um calhau desgovernado e duma placa geológica irrequieta! Para que servem as nossas interrogações metafísicas se tudo se joga na órbita caótica dum asteróide ou no lado aleatório dos movimentos de convecção do magma terrestre? A «insustentável leveza» do nosso ser causa-nos um aperto no coração.
HUBERT REEVES- Aves, Maravilhosas Aves.
Terça-feira, 9 de Novembro de 2004
TENTATIVE DE DESCRIPTION D`UN DINER DE TÊTES À PARIS-FRANCE (extracto)
Ceux qui pieusement...
Ceux qui copieusement...
Ceux qui tricolorent
Ceux qui inaugurent
Ceux qui croient
Ceux qui croient croire
Ceux qui croa-croa
Ceux qui ont des plumes
Ceux qui grignotent
Ceux qui andromaquent
Ceux qui dreadnoughtent
Ceux qui majusculent
Ceux qui chantent en mesure
Ceux qui brossent à reluire
Ceux qui ont du ventre
Ceux qui baissent les yeux
Ceux qui savent découper le poulet
Ceux qui sont chauves à l`interieur de la tête
Ceux qui bénissent les meutes
Ceux qui font les honneurs du pied
Ceux qui debout les morts
Ceux qui baionnette...on
Ceux qui donnent des canons aux enfants
Ceux qui donnent des enfants aux canons
....
JACQUES PRÉVERT- Paroles
Quarta-feira, 3 de Novembro de 2004
AMÉRICA-AMÉRICA
As previsões confirmaram-se: ganhou Bush.
Mas como poderia ser de outro modo se a América é um país em que os idiotas e os vigaristas são cada vez mais maioritários? Como poderiam eles eleger alguém que não fosse simultaneamente idiota e vigarista?
Segunda-feira, 1 de Novembro de 2004
SIMPLIFICAÇÃO DAS BRUXAS
Elas são bruxas, cabras ao vento e à urze, candeias incendiando os homens dentro das calondras.
( esboço de poema em dia de bruxas)