A banalidade dos discursos dos presidentes da República posteriores ao 25 de Abril trouxe-me à memória a belíssima frase de Maio de 1968: a imaginação ao poder!
O que os senhores presidentes mostraram foi tudo menos imaginação, ficando-se todos por frases e propostas estafadas e que já demonstraram os seus maus resultados. O que nos disseram todos foi que o que era bom para Portugal era um bloco central. Como se o perpetuar a mesma política já seguida pelos dois partidos que foram as principais causas do estado em que o país se encontra, somando os dois poderes partidários, fosse a solução.
Infelizmente, à esquerda, o que existe demonstra não servir para resolver o problema mas, sobretudo, para impedir uma solução alternativa.
O PC e o BE encontramse amarrados à missão salvífica que continuam a atribuir à por eles chamada classe operária.
Não é uma conceção política. É uma conceção religiosa porque atribui a um grupo, a uma igreja, e, antes de tudo ao chefe desse grupo, a missão de salvar a humonidade. A classe operária, Marx e Lenine os salvadores da humanidade.
Na base dessa concepção salvífica está a concepção (erradamente) atribuída a Rousseau de que os homens nascem bons e é a sociedade que os perverte, no caso presente, a sociedade capitalista.
Ora os homens não são bons nem maus, porque são similtâneamente bons e maus. E não é um operário por ser operário que é melhor que um capitalista por ser capitalista. Quanto ex-operários não viraram os piores capitalistas! E quantos capitalistas não teem uma elevada consciência social!
Antes de mais desconfiemos do poder, qualquer poder, porque o poder pode facilmente transformar os homens para pior.
Se queres conhecer o vilão é pôr-lhe o poder na mão.
Depois dessa certeza que nos obriga a desconfiar de nós mesmos quando pretendemos o poder, desconfiança essa sem a qual todas as boas ideias soçobram, quais os princípios que deve nortear qualquer homem livre e de bom caráter?
O primeiro deles é, sem dúvida, a liberdade. Sem ela nada mais tem sentido. Um escravo bem alimentado não é por ser bem alimentado que deixa de ser escravo- isto é, uma coisa e não um homem.
O segundo princípio é o da justiça. Que não é exatamente a igualdade mas sim algo que poderia resumir nesta fórmula: de cada um segundo as suas capacidades, a cada um segundo a sua entrega aos outros.
É óbvio que estes princípios conjugados conduzem ao tratamento desigual do desigual. E isso significa que quem entregou mais à sociedade, esforçando-se, trabalhando, criando, arriscando para a comunidade deverá receber mais do que os que não se esforçam, não trabalham, não criam, não arriscam em benefício dos outros.
Como nisso somos todos diferentes, e essas diferenças são inultrapassáveis, as retribuições também deverão ser diferentes, embora sempre de acordo com esses princípios.
Mas é óbvio que o princípio da justiça não deve levar-nos a desigualdades extremas que destruiriam esse princípio: as desiguldades para serem justas devem ser limitadas.
E essa limitação deve ser balisada pelo seguinte princípio: as desigualdades só deverão existir enquanto servirem melhor que a igualdade para aumentar a retribuição da metade que recebe menos do rendimento global.
Ontem Fátima Campos Ferreira entrevistou Alexandre Soares dos Santos. Hoje Fernando Nobre.
Nos dois casos tratou-se de negócios. Nos dois casos bem pouco nobres.
Soares dos Santos mostrou em abundância o seu rosto "humano" de empresário : isto é - falou da sua preocupação com os pobres, isto é, da sua caridade.
Tenho dito repetidamente que o oligopólio da distribuição, controlado por ele e por Belmiro de Azevedo, é uma das principais causas da crise nacional. A prová-lo está uma agricultora que também hoje falou no telejornal: os preços que Alexandre Soares dos Santos e Belmiro de Azevedo pagam aos empresários, em particular aos agricultores, são os de há DEZ ou QUINZE anos. Mas os preços de venda ao consumidor são bem atuais.
Mas os contratos de trabalho que Soares dos Santos faz são a prazo, embora para postos de trabalho permanentes. E o salário que paga a grande número dos seus trabalhadores, em particular aos recem-contratados, é o salário mínimo nacional.
Quanto a Fernando Nobre, a sua entrevista chegou ao deprimente. Duas coisas dali resultaram: o Nobre senhor negociou com o PS e o PSD, e foi para quem lhe deu ( prometeu) mais: a presidência da Assembleia da República.
Percebeu-se bem o que quer: o reino dos céus, isto é, a Presidência da República.
Em troca, como bom cristão, pratica a caridade, juntamente com Passos Coelho.
Isto é, dá uns trocos aos que sofrem para ter o reino dos céus.
Ah nobre povo que tais senhores tem!
Falam os esquecidos. Falam ajoelhados
Do cimo dos tímpanos
Falam através da pedra:
Somos todos teus
Iguais.
E a noite junta-se aos lábios aos líquenes
À verdade e à beleza.
E o dia é um jogo de vozes
Inocente e cruel
Até ao macio do musgo.
Regresso ao Odisseus depois de um tempo de pausa por motivos de saúde da minha filha.
Entretanto, muitas águas passaram sob as pontes. Portugal entrou num período crítico. Mais do que nunca se tornou urgente refletir no país que queremos e no que devemos fazer para termos o país que queremos.
Penso que o dia de hoje foi um dia importante para o futuro de Portugal. Hoje, no jornal PÚBLICO, foi publicado um manifesto assinado por homens livres e honestos, entre os quais os meus amigos VASCO LOURENÇO e RUI NAMORADO.
ESPERO QUE NÃO FIQUEM POR AQUI.
Já tenho repetido no Odisseus que Portugal é um país esquizofrénico, em que há um eleitorado que vota no PC, no BE e no PS por serem o mal menor. É urgente que aqueles que defendem a JUSTIÇA como algo de essencial para que o nosso país deixe de ser uma terra sem direitos para tantos, saibam e tenham a coragem de pensar, mas também de agir. É necessário que aqueles que estão em espaços nos quais já não acreditam tenham a coragem de deixar esses espaços e construir algo em que acreditam.