blog filosófico, cultural e político
Domingo, 30 de Janeiro de 2005
OS POLÍTICOS E O PAÍS
OS POLÍTICOS E O PAÍS
É tão vulgar ( e a palavra utilizo-a aqui em todos os sentidos que tem) desancar-se nos nossos políticos que não posso deixar de fazer aqui a sua apologia, contra os seus críticos, quase todos fáceis.
1ª Verdade
Dos que criticam os políticos, 999 em cada mil, pelo menos, se estivesse no poder faria pior ou muito pior do que eles.
2ª Verdade
Quem critica, na generalidade, não se quer dar ao trabalho de fazer seja o que for em prol da comunidade, mesmo que isso redunde em benefício próprio. É muito mais cómodo que sejam os políticos a levarem a estrada, se possível a auto-estrada, à porta de casa, que sejam os críticos a mover uma palha para isso, mesmo quando a casa é deles.
3ª Verdade
Acusam-se os políticos de aldrabões e mentirosos. Isto é, acusam-se os políticos de serem o que 999 em cada mil críticos são, com uma grande vantagem para estes: é que não se expõem publicamente, incluindo ao ridículo.
4ª Verdade
Acusam-se os políticos de ladrões. È o que 999 em cada mil críticos são. E uma parte destes é tão desonesta que não reconhece que o é; ou tão estúpida que nem percebe que o é.
5ª Verdade
Veja-se o SANTANA LOPES. Coitado. Até mete dó de tanta água meter. Tinha o rapaz uma tão boa qualidade de vida, com tantas mulheres do que há de melhor na praça, e meteu-se-lhe na cabeça a ridícula ideia de que seria melhor para ele ser Primeiro-Ministro.
Agora, em vez de beijos à Cinha Jardim tem de dar beijos a peixeiras e velhinhas desdentadas.
O SANTANA faz parte da classe dos homens da noite. Quantos há por aí? Seguramente uns 20% da população no activo. Desde proxenetas a gigolos, travestis a barmans, jogadores de roleta e batoteiros das cartas a frequentadores de boites.
Quanto ao SANTANA ele faz parte dos homens que gostam de mulheres bonitas ( chapeau!) e de discotecas - cultura suficiente para ele ter sido Secretário de Estado da dita.
Mas tem tão boa apresentação e fala tão bem! Isso não o coloca em dignidade acima dos tais 20% da classe a que ele pertence? Com que legitimidade o criticam? Com que justiça?
6ª Verdade
O SÓCRATES faz parte da classe cujos melhores representantes são os vendedores de automóveis. Incluem-se nesta classe pelo menos 40 % da população dos homens portugueses no activo. Além dos vendedores de automóveis inclui a vastíssima classe dos empregados de escritório, dos delegados de propaganda médica, dos vendedores de cobertores e guarda-chuvas das feiras, etc., etc.
Não está o SÓCRATES acima deles todos? Até fez alguma coisa como ministro. Fala tão fluentemente como o melhor deles, tem boa apresentação. Alguém tem dúvidas que é superior a 999 em cada mil da sua classe?
7ª Verdade
O PORTAS faz parte da classe dos cínicos. Dos que dizem uma coisa e pensam e fazem outra. Dos que são contra o aborto e mandam as mulheres abortar, cá ou no estrangeiro. Dos que são católicos, apostólicos, romanos, e já vão no 5º casamento ou praticam a sodomia. Dos que tiram aos pobres remediados para dar aos ricos, mas têm muita pena dos pobrezinhos, e até dão bolas de queijo para a Caritas.
Mas, apesar de estar incluído nessa classe, o Portas não tem mulher para mandar abortar no estrangeiro ou se divorciar, aumentou algo as pensões mais baixas e o abono de família dos de mais fracos rendimentos.
É convencido e vaidoso, delicia-se com as suas próprias tiradas?
Mas cínicos, mentirosos e vaidosos são pelos menos 20% dos portugueses no activo. E sobre 999 em cada mil deles tem uma vantagem: é inquestionavelmente inteligente.
8ª Verdade
O JERÓNIMO DE SOUSA é um botas. Contra toda a evidência, os botas, que são bem 10 % da população no activo, continuam a achar que para se pregar um prego ainda tem de se usar um martelo, e cortar palha só o pode fazer uma foice. Máquinas que enfiam uma cavilha num segundo, e ceifeiras que cortam e enfardam um hectar de trigo numa hora, para eles são invenções da reacção. Assim como o foi o Gulag e as purgas estalinistas.
O homem é um botas. Mas num mundo em que 999 em cada mil não acredita em nada, acreditar que a classe operária continua a ser o novo Cristo Redentor, pelo menos é alguma coisa em vez de nada.
9º Verdade
O FRANCISCO LOUÇÃ é um convencido cheio de boas intenções. Faz parte dos restantes 10% da população no activo. É verdade, também os há. Mas, como todos sabem, de boas intenções está o inferno cheio. E, muitas vezes, fazem demasiado mal às nações.
Essa gente faz-nos sorrir de ternura. Mas ele é inteligente, se bem que convencido, e isso coloca-o acima dos anteriores, e entre os melhores dos 999 em cada mil da sua classe. Já não é nada mau.
Quem, depois de tudo o que acima vai dito, ainda ousará criticar os políticos, sobretudo neste período em que se estafam, não dormem, comem sandes à pressa, ficam roucos de tanto falar, cheiram a peixe e chouriço ao mesmo tempo, e ainda por cima têm não só os adversários, a comunicação social, mas também esses críticos contra eles?
Sábado, 29 de Janeiro de 2005
EDWARD MUNCH - A Dança da Vida
NOITE BRANCA
Um tipo bêbado perguntava a um cego: que tal o fogo de artifício?
E este respondia extasiado:
-Lindo! Lindo!
Ao lado, um branco baixo dançava com uma preta alta, ambos tortos, um para um lado, outro para o lado oposto, de modo a que a parte torta de um encaixava perfeitamente debaixo da parte torta de outro, e o mais baixo parecia um apêndice anómalo da mais alta.
É só o que recordo de uma longínqua noite branca, num baile da minha aldeia - e o solitário grito do saxofone atravessando o céu e tocando as estrias de todas as estrelas.
Domingo, 23 de Janeiro de 2005
MARC CHAGALL- Aniversário
Sábado, 22 de Janeiro de 2005
TOCO A COR REAL
Toco a cor real
Dos teus cabelos
E as pombas erguem-se
Dos sabores de Outono
E os perfumes
Ao vê-los em cada fim de tarde
Tornam-se no ouro que arde
E na beleza e na verdade
Que se entendem
Quando aplacas com um só
Sorriso o mal.
Tudo isso és tu
Que preparas a chegada
Da noite com velas
De seda pura
E eu sou então tão pobre e nu
E inocente e sábio
Como a alvorada
Que entra pela sombra escura
E posso assim esquecer que a morte
Pesa soturna em cada lábio.
HENRIQUE DÓRIA-Mar de Bronze
O GRANDE PÃ MORREU
Já antes de Montaigne, houve moralistas para sustentarem que o recém-nascido é velho o bastante para morrer.Na construção metafísica mais segura de si, na obra de arte mais afirmativa, há sempre um MEMENTO MORI, um esforço, implícito ou explícito, para conter a fuga do tempo fatal, a entropia do ser vivo sob todas as suas formas. É a esse combate que o discurso filosófico e a geração da arte devem a tensão que os inspira, a crispação irresoluta que conta entre as suas modalidades formais com a lógica e a beleza. «O Grande Pã morreu» é um grito a que assombra até essas sociedades às quais associamos, talvez demasiado convencionalmente, uma atitude optimista.
GEORGE STEINER-Gramáticas da Criação
Segunda-feira, 17 de Janeiro de 2005
VICTORIA DE LOS ANGELES
Domingo, 16 de Janeiro de 2005
VITÓRIA DE LOS ÂNGELES
Morreu Vitória de Los Ângeles, uma das vozes mais belas que a humanidade produziu, e que foi com Kathleen Ferrier, com a Callas e as ainda vivas Gundula Janowitz e Mara Zampieri (vejam La Nave Va, de Fellini, e ouçam a Zampieri!) da meia dúzia de grandes divas do século XX.
A voz humana é o mais extraordinário instrumento existente. E a voz de Vitória de Los Ângeles perdurará para ser ouvida e amada enquanto houver humanidade.
ESQUELETOS NA PRAIA
O Expresso deste sábado trouxe, na Revista, um dos artigos mais interessantes que tenho lido em jornais ( e há-os casda vez menos): um texto sobre as catástrofes terrestres, as religiões e a globalização. Há cerca de 100 anos apareceram nas praias de Zanzibar esqueletos humanos e animais, restos da explosão do Krakatoa, um vulcão a oeste de Java ( mais uma vez a Indonésia!). A erupção do Krakatoa teve consequências em toda a Terra, e foi explicado pelos padres muçulmanos como um castigo de Alá pelo facto de o país se deixar subjugar pelos infiéis holandeses. O que conduziu às primeiras revoltas contra o domínio holandês da Indonésia.
Já em 1906, o grande tremor de terra que teve origem em movimentos tectónicos na Falha de Santo André teve também explicações religiosas como sendo um castigo de Deus previsto por fanáticos padres evangélicos, e levou à criação de uma das correntes religiosas mais influentes nos Estados Unidos, a Igreja Evangélica, de cariz pentecostista e conservador, que foi decisiva para a eleição de George Bush.
Ao contrário do que sucedeu com o sismo recente a oeste de Sumatra, cuja explicação científica todos conhecem, a explosão do Krakatoa e o grande tremor de terra de Los Ângeles não tinham causas conhecidas ao tempo, e, por isso, puderam ser atribuídos ao castigo de Deus. Mas os seus efeitos ainda hoje perduram, no segundo caso para mal da humanidade.
O artigo é excelente, aconselho a sua leitura, mas permito-me acrescentar algo que me parece importante: se o artigo põe em relevo a importância da globalização, que começou com a informação mundialmente difundida de imediato sobre a erupção do Krakatoa, é importante pôr em relevo também a importância positiva da globalização no socorro às vítimas do tremor de terra de Sumatra.
É devido à globalização que o pequeno indonésio sobrevivente à catástrofe e que vestia a camisola da seleção portuguesa de futebol irá ter uma casa oferecida pela nossa seleção!
Sexta-feira, 14 de Janeiro de 2005
WORDS
Axes
After whose stroke the wood rings,
And the echoes!
Echoes travelling
Off from the center like horses.
The sap
Wells like tears, like the
Water striving
To re-establish its mirror
Over de rock
That drops and turns,
A white skull,
Eaten by weedy greens.
Years later I
Encounter them on the road...
Words dry and riderless,
The indefatigable hoof-taps.
While
From the bottom of the pool, fixed stars
Govern a life.
SYLVIA PLATH