Como relógios quando invisível
o seu passo chega ao fim
para de novo e sempre começar
é esta música que nos une
à terra, aos rostos singulares
dos homens.
Chamam-lhe esperança
num pequeno lugar
onde o mar vem mais no seu sussurro
íntimo.
Saberemos o lugar certo?
Mas é para ele que caminhamos.
Saberemos o rosto da amada?
Mas quando o Inverno age
esperamos que as sementes da Primavera
se transformem para lhe dar oferendas.
HENRIQUE DÓRIA-Círculo da Terra
Sabendo que vão morrer, as árvores querem presentear-nos com uma cornucópia de beleza.
As tílias, os plátanos, os castanheiros oferecem-nos cores nelas antes insuspeitas: amarelos, ocres, vermelhos, são as cores das sombras em que o verde se desfaz na queda.
Respiro profusamente estas cores mais humanas que o azul do céu que me quer absorver.
Cores quentes que, neste fim de Outono, nos acariciam a pele.
Só consigo tratar a Senhora Professora, Doutora, Maria Manuela Ferreira Leite por Dona.Perdoem-me (ela que me perdoe) o desrespeito, mas não consigo tratá-la de outro modo.Outro tratamento sairia da sua figura mais rapidamente que um selo colado com saliva. Pelo menos se colado com a minha saliva.
Mas vamos ao que interessa.
A Dona Manuela foi uma Dona prudente: mal foi eleita não se pôs para aí a espingardear como esse rapazinho que governa Gaia. Parecia primeiro olhar para o caminho, e, depois, escolher a passada.
Mas os caminhos, mesmos as ruas direitas, às vezes transforma-se em labirintos.
Foi o que aconteceu à Dona Manuela: pensava que entrava para o palácio e entrou para o labirinto.
Tem necessidade de fazer oposição - mas trai-a a sua própria posição.
Como oposição cabe-lhe o papel de criticar as medidas do governo. Mas ou as medidas do governo são as que ela tomaria também e a sua crítica é um passo em falso. Ou as medidas que ela tomaria se governasse são outras que não as deste governo, mas a sua posição fá-la estatelar-se.
O exemplo mais flagarnte foi o do aumento do salário mínimo nacional para 450 €uros anunciado pelo Engenheiro Sócrates ( não, não é ironia, ele tem cara de Engenheiro. Se o é ou não, não sei).
Acordada para fazer oposição, lá tinha a Dona Manuela que vir dizer não a essa medida.
Não bastava já que uma tal associação de pequeninos empresários viesse fazer chantagem. A Dona Manuela tinha de fazer ouvir a sua voz cheia de autoridade sobre o assunto. E vai daí, à má cara e à má fila ( não pensem no que eu penso) a Dona Manuela, como boa Dona de casa preocupada com os trocos do supermercado, diz que é uma irresponsabilidade governativa.
Sabe-se que os pequeninos empresários não lêem jornais. Mas parece que o retiro para reflexão antes do grande baile obrigou a que a Dona Manuela não lesse os jornais, nem visse os telejornais.
Se ela o tivesse feito, teria lido, ou ouvido, que Portugal é o país da Europa onde são maiores as desigualdades económicas e sociais. Que neste particular estamos ao nível quase do terceiro mundo. E, perante isto, desde o cardeal aos padres, passando pelos senhores bispos, desde a Opus Dei à sua congénere Opus Gay, não houve ninguém que não dissesse: assim não pode ser. O Sócrates ( aqui o nosso primeiro já não é engenheiro) não faz nada para acabar com os pobrezinhos.
E quando todos queriam acabar com os pobrezinhos, vem a D. Manuela irritada com o desperdício e grita: não, para bem dos pobrezinhos, eles, em 2009, têm de ficar ainda mais pobrezinhos.
Marcelo ri-se para o lado. Rangel range os dentes. E o papagaio de Gaia fala fala que ninguém o cala.
E eu digo: Ó Dona Manuela, olhe pela sopa, acuda à panela.