( artigo publicado no semanário GRANDE PORTO, de 28.10)
Para se compreender a política deste governo é necessário conhecermos um argentino, Domingo Cavallo. Cavallo foi apontado pelos ministros das finanças, Vítor Gaspar, e da economia, Santos Pereira, como o seu mentor. Doutorou-se em Harvard, e foi professor na Universidade Católica de Córdova. Fez parte do governo da Junta Militar argentina no criminoso Ministério do Interior. Em 1982 foi nomeado Presidente do Banco Central argentino. Tomou, então, a sua principal medida: nacionalizou grande parte da dívida externa das empresas privadas argentinas.
Após a queda da Junta Militar, fez parte do governo do corrupto presidente Menem, entre 1989 e 1996, nós últimos cinco anos como Ministro das Finanças. Conseguiu controlar a hiperinflação, fazendo equivaler o peso argentino ao dólar, à razão de 1 para 1. Privatizou as grandes empresas estatais argentinas: água, correios, etc.. A Argentina teve um bom crescimento económico nos anos imediatos. Porém, esta política foi desastrosa para os mais pobres, agravando as desigualdades sociais e originando um desemprego de cerca de 20%. Por outro lado, as privatizações foram conduzidas com um tal grau de corrupção que se tornaram escândalo nacional. Cavallo denunciou essa corrupção mas não se demitiu. Porém, reeleito Menem em 1995, em 1996 este dispensa-o.
Nessa altura, era claro que a terapia de Cavallo já não funcionava: a alta do dólar levou a enormes dificuldades competitivas da economia argentina, o que tornou a dívida pública insustentável, apesar da baixa generalizada dos salários dos funcionários públicos e dos despedimentos massivos. Com a economia em retração, as receitas diminuíram. E tudo isso levou a uma quebra no investimento e a fuga de capitais, crescendo as taxas de juro. A partir de 1999, a Argentina entrou em depressão e, em 2001, o presidente De la Rua chamou Cavallo para ministro da economia. Este pretendeu impor novamente a receita neoliberal: despedimentos e baixas de salários. Mas tal não resultou: aumentou a descrença na economia e a fuga de capitais, fuga esta que Cavallo pretendeu combater através do corralito, impedido a movimentação de depósitos bancários. Gerou-se o caos na Argentina com a população em desespero a saquear lojas e supermercados. Dela Rua declarou o estado de sítio. Cavallo demitiu-se, seguido do presidente, que se pôs em fuga para não ser linchado pela multidão. Hoje, Cavallo não pode regressar à Argentina sem ser fortemente escoltado, tão grande é o ódio que lhe vota o povo argentino.
O argumento de Cavallo para as suas medidas era o mesmo que hoje se utiliza: ou isto ou o caos. Mas o governo do Presidente Kirchner, que tomou posse em 2003, demonstrou que não era assim: com medidas contrárias às de Cavallo, a Argentina entrou num sustentado crescimento económico e a pobreza diminuiu drasticamente.
Cavallo, agora professor nos EU, reconheceu o falhanço da sua política, em 2010, ao pronunciar-se sobre a dívida da Grécia. Escreveu sobre a crise argentina:
“A nossa primeira resposta veio na forma de uma série de medidas destinadas a criar confiança e ganhar competitividade, mas elas não foram suficientes. A nossa segunda resposta veio na forma de um plano de consolidação orçamental que incluía a redução de salários do setor público e das pensões. Mas, tudo isto provocou um agravamento da recessão e o exacerbamento das tensões sociais.”
Se assim é, porque persiste este governo em fazer de nós burros, aplicando medidas que o próprio Cavallo reconhece que não resultaram?
Porque Gaspar e Pereira são burros?
Não, eles sabem o que fazem, eles são muito pior do que isso.
As cúpulas das igrejas teem a forma dos seios das mulheres.
É a face celeste do amor nesse culto assente no mistério do nascimento de Deus do ventre duma virgem
HENRIQUE DÓRIA- Fragmentos
Argumentando com num suposto desvio colossal do défice das finanças públicas veio o governo anunciar o corte dos subsídios de férias e de Natal na função pública para os anos de 2012 e 2013.
Para além da falsidade da justificação da medida, não só porque Passos Coelho e a TRALHA que o rodeia tinham participado na elaboração do orçamento para 2011, mas também porque o ministro da finanças era um dos administradores de topo do Banco de Portugal, um facto ressalta aos olhos de todos: então só a função público é que é afetada? E porque o não são afetados os trabalhadores do setor privado, incorrendo o governo no risco de ver declarada inconstitucional a lei do orçamento por flagrante violação do princípio da igualdade?
Sobre isso o primeiro ministro na sua trágico-cínica comunicação ao país nada disse, nem o disseram os seus ministros.
Mas disse-o um dos doutores em economia que pululam nas nossas universidades (e muitos passam destas para o governo, e do governo para os grandes negócios), um tipo que dá pelo nome de JOÃO MIRANDA, no seu blog BLASFÉMIAS. Escreveu esse GÉNIO que não conseguiu conter-se e revelou o jogo do governo no dito blog, sob o título A MÃE DAS REFORMAS ESTRUTURAIS:
Não faz grande sentido pedir reformas estruturais no dia a seguir ao governo anunciar um corte de 15% nos salários da Função Pública (que se soma a um corte de 5% a 10%). O corte de salários da Função Pública é a grande reforma estrutural. A partir do momento em que os lugares na Função Pública deixam de ser os mais bem pagos, tudo se simplifica. Os institutos extinguem-se por si. As escolhas tornam-se óbvias. As resistências à mudança desaparecem. Pensem nisto: se a RTP for privatizada os funcionários passam a receber 13º e 14º mês. Revolucionário. O problema vai colocar-se ao contrário: como captar quadros para a Função Pública? Como suprir os serviços essenciais do Estado de gente competente? Que serviços essenciais o Estado deve prestar? A escassez de quadros e de recursos tornará a resposta a estas perguntas tão óbvia que não haverá sequer discussão.
Disse, mas ainda não disse tudo. O que ele não disse foi que através desta medida o governo pretende:
1º Criar uma marxista “exército industrial de reserva”, isto é, transformar a classe média que depende da função pública e é competente num exército de desesperados que aceita vender a suas capacidades a qualquer preço ao setor privado.
2º Promover uma colossal transferência de riqueza para os mais poderosos na execução da estratégia que já apelidei neste blog de A CONSPIRAÇÃO DOS ESCROQUES.
3º Desistir definitivamente da qualificação dos nossos TRABALHADORES e PATRÕES e na investigação científica e tecnológica como motores do nosso desenvolvimento.
Que assim é, e que esta medida não é ditada por um imperativo de pagamento imediato da dívida e de redução do défice do Estado provam-no vários factos:
a) O Banco de Portugal poderia vender parte das reservas de ouro que detém no valor de cerca de 15 mil milhões de euros e entregar os dividendos ao governo para acudir ao pagamento da dívida a um prazo inferior a três anos.
b) O governo poderia criminalizar com penas draconianas a transferência de dinheiro para paraísos fiscais publicando em simultâneo uma amnistia para os que fizessem regressar ao país o dinheiro colocado em paraísos fiscais e off-shores.
c) O governo poderia criminalizar a sub e a sobrefaturação, uma das causas da falta de liquidez dos nosso bancos e da impossibilidade de financiarem a economia.
d) O governo continua a gastar milhões em negociatas com os privados, como o prova o facto de a rubrica orçamental de AQUISIÇÃO DE BENS E SERVIÇOS, através da qual se fazem essas negociatas, ter aumentado 42,7% em Julho, e 33,7 % em Agosto.
e) E, até, em medidas menores, mas exemplares, como a do honesto ministro da educação que aumentou de 80 para 85 mil euros por turma o financiamento dos colégios privados com contrato de associação onde estudam os meninos mais ou menos ricos.
Perante isto, o que diz o PS?
Generalidades inúteis ou, como aconteceu nesta sexta num debate entre o incontornável ÂNGELO CORREIA o genial FRANCISCO ASSIS, este falou das eleições no PS francês como acontecimento mais importante da semana.
POBRE POVO!
Aventurar-se na leitura de OS CAVALEIROS DO AMOR OU A RELIGIÃO DA RAZÃO, de Sampaio Bruno, é aceitar embrenhar-se nos caminhos difíceis da contradição. E a contradição começa logo no título da obra. Cavaleiros é uma palavra que nos remete para a guerra, isto é, para o contrário do amor. E religião é exactamente o contrário da razão, é a crença naquilo que a razão não consegue explicar. Nunca poderá haver religião da razão, pese embora a desrazão dos revolucionários franceses que quiseram instituir uma religião da razão.
Mas a contradição prossegue: o livro não é um livro, mas apenas o plano dum livro por fazer.Não um caminho, mas um mapa dum caminho a caminhar.
Finalmente, o conteúdo do mapa é também uma contradição. Começa por traçar uma tradição imperial, para depois se dirigir para a revolução subterrânea. Mostra-nos, por fim, os caminhos dos santos e dos heréticos que terminam em pranchas de academias, juntas e lojas.
Como decifrar o mapa destes caminhos que, a cada passo parecem desembocar em lugares sem saída?
Sampaio Bruno dá-nos a chave desse mapa no lugar onde nos fala do Cavaleiro da Ordem de Cristo, do Fiel do Amor que foi Manuel de Faria e Sousa, o primeiro biógrafo e intérprete de Camões, ao decifrar a seguinte parte da Ode III do grande poeta:
A ser como soía,
Pudera levantar vossos louvores;
Vós, minha Hierarquia,
Ouvireis meus amores,
Que exemplo são ao mundo já de dores.
“ Manuel de Faria e Sousa dir-nos-á ele quem, de verdade, era esta Hierarquia, quando, na “Palestra II”, da “Primera noche” de suas noches claras, nos define o “ Que es noche, y la conveniência que tiene com el estúdio. Para las Academias, y nueva Cavalleria.”
As Academias são as Lojas. E a nova Cavalaria, cá os temos, seus cavaleiros. São os Cavaleiros do Amor; são os Cavaleiros do Espírito. Isto é, são os que professam a Religião da Razão. E, de longuíssima data preparando-a, se encaminham para a Revolução.”
( continua )
Em vez do "penso, logo, existo" de Descartes, prefiro: outro pensa-me,logo, existo. Ou, dizendo o mesmo de outro modo: outro ama-me, logo, existo.
HENRIQUE DÓRIA-Fragmentos
Joan Miró -hombre y mujer delante de un montón de excrementos
Somos uma semente do nada na infinita sementeira do Cristo Redentor. Por isso, como perceber que por uma insignificante semente teve Ele de travar uma batalha com o demónio e morrer na cruz como um deus qualquer.
HENRIQUE DÓRIA-Fragmentos